VI JORNADA LUSO-BRASILEIRA DE DIREITO DE AUTOR
Os desafios da Inteligência Artificial, Direitos Intelectuais e ‘deep fakes’ foram os temas em debate na VI Jornada Luso-Brasileira de Direito de Autor.
Jornada
Luso-Brasileira
Num debate em torno de três perspetivas sobre a forma de olhar os Direitos de Autor: “Inteligência Artificial, Direitos Intelectuais e deep fakes ”, a VI Jornada Luso-Brasileira foi organizada pela Associação Portuguesa de Direito Intelectual (APDI) e pelo Departamento de Direito Civil de Direito da Universidade de São Paulo e realizada no âmbito do encerramento do VI Congresso de Propriedade Intelectual, que decorreu nos dias 19 e 20 de outubro, em Lisboa.
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Realizou-se no dia 20 de outubro de 2023 a VI Jornada Luso-Brasileira de Direito de Autor. O evento marcou o final do VI Congresso de Propriedade Intelectual e contou com a presença de reputados juristas brasileiros e portugueses dedicados aos temas mais atuais do domínio da Propriedade Intelectual.
A Jornada foi promovida pela Associação Portuguesa de Direito Intelectual (APDI) e pelo Departamento de Direito Civil de Direito da Universidade de São Paulo, sob a coordenação científica do Professor Doutor Dário Moura Vicente e da Professora Doutora Silmara Chinellato, que presidiram à sessão de abertura.
O primeiro painel, moderado pela Prof.ª Doutora Sofia de Vasconcelos Casimiro, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUC) e Vice-Presidente da APDI, contou com a participação do Prof. Doutor Antonio Carlos Morato, da Universidade de São Paulo e do Prof. Doutor Alberto de Sá e Mello, da Universidade Lusófona e membro da direção da APDI.
Num painel dedicado à reflexão sobre os direitos de autor na era da inteligência artificial, o Prof. Doutor Antonio Carlos Morato iniciou a sua intervenção destacando a importância do estudo da inteligência artificial e a sua repercussão no Direito de Autor, nomeadamente nos seus aspetos patrimoniais e morais, “sobretudo porque presenciamos conflitos significativos em áreas criativas, como ocorreu na greve dos roteiristas em Hollywood, noticiada com destaque pela imprensa”.
Refetindo que, “o enfoque adotado em nossa participação foi o da proteção ao autor de obra literária, sendo relevante observar os desdobramentos da greve mencionada (Writers Guild of America (WGA) x Alliance of Motion Picture and Television Producers) que poderiam ser utilizados como referência em contratos de edição, sendo possível destacar a vedação da utilização de ferramentas de inteligência artificial para escrever ou reescrever roteiros ou material literário, a impossibilidade de exigir que roteiristas utilizem ferramentas como o ChatGPT, bem como o dever de informação quanto ao material (seja total ou parcialmente) ter origem em ferramenta de inteligência artificial”.
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Não obstante os aspetos positivos da existência desta tecnologia, designadamente “a possibilidade de utilização na área acadêmica, saúde, segurança e em outros aspectos da vida social”, o Prof. Doutor Antonio Carlos Morato teceu algumas considerações relativamente aos desafios da regulação dos sistemas de inteligência artificial.
“Todavia, simultaneamente à regulação em diversos ordenamentos jurídicos, será necessária a utilização dos avanços tecnológicos para detectar o uso de inteligência artificial quando não for cumprido o dever de informar que a criação decorreu de seu uso, algo que não se distancia do que ocorreu com programas identificadores de plágio ou de filtros de mensagens eletrônicas não solicitadas, nas quais a intervenção do Estado pela edição de normas foi insuficiente para limitar a prática”, concluiu.
O Prof. Doutor Alberto de Sá e Mello iniciou a sua intervenção por conceptualizar a expressão inteligência artificial e a sua interligação com os direitos de autor. “Para que a expressão inteligência artificial (IA) relacionada com direitos de autor faça sentido, é necessário dar-lhe conteúdo e significado concretos e avaliar todas as implicações práticas e teóricas desse relacionamento”.
Seguidamente, destacou a necessidade de equacionar três problemas centrais que se correlacionam entre os sistemas de inteligência artificial, direitos intelectuais e direitos de autor.
“Para avaliarmos da aptidão dos sistemas de IA para atrair a protecção pelo direito de autor para os produtos da sua operação, temos de equacionar e resolver três problemas: a) Os bens imateriais produzidos por sistemas de IA atingem um nível de criatividade suficiente para serem protegidos como obras intelectuais? b) No caso de a resposta à questão anterior ser afirmativa, deve a sua exploração ser objecto de um exclusivo semelhante ao correspondente aos direitos intelectuais? c) No caso de a resposta à pergunta anterior ser sim, a quem deve pertencer esse direito exclusivo? É na resposta a estas questões que se resolve o estatuto dos sistemas de IA”, concluiu.
“Direitos de autor, direitos de personalidade e deep fakes” foi o tema central do segundo painel, moderado pelo Prof. Doutor Alexandre Dias Pereira, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, no qual foi oradora a Prof. Silmara Chinellato, do Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e o Prof. Doutor Nuno Sousa e Silva, da Universidade Católica Portuguesa do Porto e membro da Direção da APDI.
Num painel dedicado à forma como os deep fakes são utilizados com o recurso à inteligência artificial na manipulação de imagens, sons e vídeos, e como se correlacionam com os direitos de autor e de personalidade.
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De acordo com a Prof. Doutora Silmara Chinellato, “Deep fake compreende a utilização de imagem e/voz de pessoa viva ou morta, com emprego de tecnologia, notadamente inteligência artificial.” E destaca que esta utlização “poderá representar “novo modelo de negócio” ou ilícito civil e penal. Envolvem direitos da personalidade, próprios a qualquer pessoa, e/ou direitos conexos de artistas, intérpretes e executantes protegidos pela legislação pertinente”.
Seguidamente, realçou os limites relacionados com o direito de autor e de personalidade, que podem resultar em dados ou na redução dos direitos e liberdades fundamentais da pessoa. E como tal, é necessário assegurar a garantia na informação e transparência na utilização dos “deep fakes”.
“Necessitam de autorização do titular, ou do licenciado, ou dos sucessores com interpretação restritiva a considerar a natureza do Direito da personalidade, regido pelo Código Civil, e do Direito conexo, tutelado pela Lei n. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, além das normas da Constituição da República. Foram analisados os problemas que se referem à autorização, à legitimidade para defesa dos direitos e a relevância da Lei 7.347, de 24.7.1985 que tutela interesses coletivos e difusos , a incidência do Código de Defesa do Consumidor quanto à informação e à transparência. Outras questões de alta indagação surgem quanto a deep fake que tenha pessoa morta como protagonista, notadamente quanto ao silêncio como eventual manifestação de vontade”.
O encerramento da Jornada foi conduzido pelo Prof. Doutor Pedro Marcos Barbosa, da Pontifícia Univeridade Catolica do Rio de Janeiro, que fez uma análise entre direitos de autor e a sua correlação com a autenticidade, originalidade e transparência na utilização dos recursos da inteligência artificial.
Segundo o Professor Pedro Marcos Barbosa “o direito autoral é estabelecido em cima da “aura” que advém da autenticidade, do vínculo entre criador e criatura. Por tal razão, ainda que o objeto de uma inteligência artificial autônoma possa chegar a resultados estéticos interessantes, ela não constituí, tecnicamente, uma “invenção”, mas mera revelação ou descoberta. Por isso, é fundamental que se editem textos legais no sentido de se exigir transparência quanto aos originadores. Fato é que o campo utilitário deve sofrer impacto maior pelo desenvolvimento das tecnologias de inteligência artificial despidas de intervenção humana, do que o que ocorrerá no ambiente existencial-estético”.
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E concluiu salientado a necessidade da adoção de uma abordagem humanista que deve nortear os direitos intelectuais, o direito de autor e da propriedade intelectual:
“De outro lado, observa-se que a reprodutibilidade técnica tem a maior capacidade de gerar lucros quanto menor for a intervenção do autor em momentos ulteriores à criação. Nestes casos, o licenciamento do uso do sinal distintivo ou o acreditamento da autoria bastam para manter o magnetismo perante o consumidor. Em outras palavras, o sistema da propriedade intelectual – conforme atualmente concebido – tem no humanismo sua pedra fundamental, ainda que uma vez segregado o produto intelectual o autor possa ser visto como mero legitimador da criação”.